A diferença entre o que eu escrevo e o que você entende

Mais um post da nossa colunista em educação falando sobre a complicada arte de ver o que me encanta e desencanta, uma boa reflexão sobre a diferença do que a pessoa quer transmitir com os textos e o que realmente as pessoas entendem.


O Homem e seus olhares
Essa complicada arte de ver que me encanta e desencanta

Quando terminei o meu curso de pós-graduação, optei por fazer a minha monografia, na área de Análise do Discurso, com o tema “Leitura” - “O Olhar do professor sobre a leitura do aluno”, proposto pela minha coordenadora. O interessante foi que acostumada com a questão da leitura, nas aulas de Língua Portuguesa, achei que falaria dessa leitura comum, considerada fixa, como código. Mas, para a minha surpresa era a arte de perceber os efeitos dos sentidos – a arte de ver. Que tem característica plurissignificativa, polifônica, dialógica, heterogênea, de dimensões múltiplas onde se casam e contestam olhares/discursos variados, sendo construídos com a interação de quem vê ou lê.

E ver, como disse Rubem Alves, é muito complicado, porque, segundo ele, “os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro”.

No entanto, ver/ler não se trata apenas daquilo que está registrado, tem a ver com a memória, com olhares de outrora, com as expectativas do Homem, ou do seu jeito de ser. Está sujeito a valores, que estão atrás dos olhos de quem observa. Tudo depende dos efeitos da (pré)visão, do lugar sócio-histórico – ideológico, de onde o sujeito vem.  Depende das condições de produção de quem vê e lê (cultura, experiência, conhecimento sobre o assunto, maturidade) ou privação de alguma coisa. Por exemplo - A água da chuva que alguém vê correndo nos campos do Sul, com certeza, terá grande diferença para os olhos do nordestino que sofre com a seca, no nordeste brasileiro.  “Uns tanto e outros nada”.

Um primeiro olhar não pode revelar tudo o que há em um quadro, em uma imagem, em um texto, em uma opinião, ou nesse ou naquele caso.  Embora, para muitos, “a primeira impressão seja a que fica”. É preciso que deixemos passar o flagrante, depois da leitura imediata, façamos uma segunda ou mais leituras para que o “não dito/o não visto” possa fazer sentido aos nossos olhos, aos olhos de quem vê; e possamos enxergar, nas entrelinhas, o que está a mais, além do que vimos, sem ver. O ser humano, com suas habilidades para comunicar, vale muito, até hoje; mas valia-se mais, antigamente de estratégias, na produção de textos; tanto escritos, quanto falados para persuadir ou sonegar os seus dizeres, que não podiam ser ditos, por falta de liberdade de expressão, como na época da ditadura militar.

Entretanto, por trás das palavras ditas, o não-dito produz sentidos que não podem ser controlados. Por isso, atrás dos nossos olhares, atrás das palavras, muitas vezes, brota a questão do preconceito, de nossos valores, de nossos sentimentos, de mal entendidos, fofocas, de forma incontrolável. E, quase sempre, passam despercebidos para quem fala, mas não para quem escuta ou lê. Um dos fatores importantes na comunicação, que nossos pais nos alertavam é “pensar bem antes de falar”. Porque uma vez dito, a interpretação será feita da forma que a pessoa que ouve geriu essa fala.

Isso acontece porque, assim como uma fotografia, uma pintura, uma história. Uma pessoa também é um texto, e é constituída pela sua interação/relação com outras pessoas. O que faz o ponto de vista de uma pessoa ser diferente do ponto de vista de outra pessoa é o seu olhar, ou seja, a interpretação que uma e outra realiza daquele ponto. Duas pessoas podem me ver de forma diferente.  Às vezes, queremos que as pessoas enxerguem o mundo com nossos olhos, ou seja, como nós vemos e pensamos, ou temos como referência. Por exemplo, se tenho uma crença, quero que todos pensem do mesmo jeito. No entanto, mesmo que compartilhem o mesmo ambiente; os sentimentos, as emoções podem ser diferentes. As experiências vividas, nem sempre, são iguais. Em cada época ou fase da vida, nós experimentamos olhares distintos.

A leitura que cada um faz de um texto, de uma opinião, de um comportamento de uma pessoa pode ser visto por vários ângulos diferentes, tendo ou não uma visão/interpretação clara e correta. Cada pessoa vê de uma maneira. Mas acredito que embora haja diferenças culturais, todas as pessoas podem manter um bom diálogo. Respeitar/aceitar/tolerar a opinião do outro, sabendo discordar, se for o caso. Não vejo porque pessoas se distanciarem por terem religiões ou partidos políticos diferentes, ou por serem dessa ou daquela classe social. Mas, segundo Fabiano Caxito, consultor de empresas, professor e palestrante, “ser modesto e despretensioso também é um aspecto chave para o sucesso na comunicação. Arrogância afasta as pessoas. Não tente, durante uma conversa, mostrar sua superioridade. Você tem um ponto de vista sobre um determinado assunto e a oportunidade de defendê-lo frente a uma pessoa, que pode concordar ou não com sua visão”.

Fonte google
Uma pessoa de visão restrita, muito limitada, vê apenas uma possibilidade de resolver os problemas. E, tem dificuldade em aceitar as opiniões das outras pessoas. Infelizmente, não se dá conta de que há várias formas de resolver cada situação. Mas isso é muito natural. Nem sempre, eu posso ver tudo; nem sempre eu posso ver da mesma forma que as outras pessoas veem, e, assim, vice – versa. Isso é óbvio! Muitas só poderão ver melhor algo, se estiverem acostumadas ou se foram treinadas a ver (caso dos especialistas); outras só conseguem ver, se lhes derem pistas. Poucas pessoas conseguirão ver o que muitas veem.  Adélia Prado, escritora mineira, disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”. “Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema”.

Por fim, a leitura que propus neste texto foi de desvendar de onde vem as leituras que   fazemos e ouvimos todos os dias das pessoas. É uma análise bem técnica, mas é preciso que percebamos o quanto a comunicação é profunda, cheia de boas e más intenções. Só através do autoconhecimento, poderemos ver melhor as coisas: com mais receptividade, mais aceitação. Segundo Sirlene Cristófano, doutora em Estudos de Literatura e Culturas Românicas em Portugal “O conhecimento da verdade leva à virtude, porém sabemos que continua sendo necessário conhecer as coisas para melhorá-las. É certo que o homem precisa primeiro conhecer como são as coisas para que se decida aperfeiçoá-las. A compreensão do processo da comunicação pode levar alguns a gozar mais das muitas possibilidades do dom que temos de nos comunicarmos”.

Abraços
                                                                                                
Professora +Nilva Moraes Ferreira             

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